VOTO ELECTRÓNICO, UMA TECNOLOGIA BRASILEIRA
No dia 3 de Outubro, os mais de 135 milhões de eleitores Brasileiros foram chamados às urnas para eleger um novo presidente, os governadores dos estados, 2/3 dos deputados estaduais e federais e 2/3 dos senadores. Terão de ir a votos, novamente, no dia 31.
O processo de eleição é simples e é produto da tecnologia brasileira: o voto electrónico, que permitiu que, tendo as urnas encerrado às 17h00 hora de Brasília (21h00 em Portugal), os resultados estivessem já apurados às 21h00 locais (01h00 em Portugal).
Trata-se de um computador responsável pelo armazenamento de votos durante a eleição: a urna electrónica. Este dispositivo foi desenvolvido no Brasil em 1996, quando foi pela primeira vez utilizado em eleições municipais. O computador apresenta três teclas: confirma, corrige e branco (para votar em branco), que o eleitor aperta depois de inserido o número de código do candidato escolhido. Se o eleitor pretender anular o voto, basta digitar um número de candidato inexistente e teclar confirmar.
Existe muita polémica sobre o voto electrónico. Desde os anos 1980, ainda no regime militar, se vem pensando sobre a questão. A ideia ganhou força a partir de pesquisas realizadas pela Justiça Eleitoral para tornar mais fácil o processo de votação e apuração dos resultados.
Os responsáveis pelo projecto da eleição informatizada foram engenheiros e pesquisadores ligados ao Comando Geral de Tecnologia Aeroespacial e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. O projecto foi concretizado por uma empresa brasileira, a OMNITECH Serviços em Tecnologia e Marketing.
A implantação do voto electrónico dificulta algumas das antigas e comuns fraudes externas da votação em papel: o «voto formiguinha», pelo qual um eleitor recebia uma cédula já marcada e devolvia a que lhe era entregue pelo mesário para que esta, uma vez marcada, fosse entregue a outro eleitor; a marcação, pelo escrutinador, das cédulas em branco; a adulteração do voto; a contagem dos votos de um candidato para outro; o falseamento das actas e dos mapas eleitorais; o falseamento das totalizações, entre muitas outras.
Na realidade, a corrupção eleitoral sempr
e foi um mal do sistema eleitoral brasileiro e o aperfeiçoamento desta legislação foi o mote da campanha que descredenciou Júlio Prestes e levou à vitória dos revolucionários de 1930. Até à aplicação do voto electrónico, quase nenhuma eleição escapava ao fantasma da fraude, comummente utilizada pelos candidatos não eleitos para justificar as suas derrotas.
A criação da Justiça Eleitoral em 1932 foi, naturalmente, um passo importante nesse processo e é tida como um marco fundamental na história do sistema eleitoral no Brasil. Desde então, todo o processo, desde o recenseamento eleitoral à proclamação dos eleitos, cabe à Justiça Eleitoral.
Mas tal não parece suficiente. Segundo diversos pesquisadores e peritos em questões eleitorais, o processo de voto electrónico também pode dar azo a fraudes e manipulação dos resultados eleitorais. Vejamos. A eleição informatizada processa-se do seguinte modo: antes do dia da eleição, são colocados os programas nas máquinas; no dia da eleição, o presidente da mesa liga a urna e digita uma senha para activá-la; é então impressa uma lista com o nome de todos os candidatos, demonstrando que todos têm zero votos; no final do dia, os resultados da votação de cada urna são gravados em disquete e é impresso um boletim de urna com a totalização, por candidato, de cada urna; as disquetes são depois levadas para os locais de apuração de cada estado, de onde os dados são transmitidos, em rede, para os Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) e, daí, para o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Note-se que cada disquete te uma «identidade própria» que é verificada pelo computador da Justiça Eleitoral. Essa «identidade» é secreta e criptografada.
Os receios surgem, justificados ou não, porque teme-se que os programas possam ser alterados no final de Agosto (quando, por exigência legal, os programas são expostos aos fiscais dos partidos) ou quando os programas são introduzidos nos computadores. Outro receio é o de que a fraude se dê no transporte dos programas da rede de informática do TSE para os TREs e para as Zonas Eleitorais. O processo de votação electrónica também ganha alguns cépticos porque quem controla o programa que protege os dados inseridos nas disquetes e o transporte dos dados até ao local final de apuração dos votos é a governamental Agência Brasileira de Informação (a célebre ABIN) e quem controla o processo de codificação dos dados (criptografia) é o Centro de Pesquisas em Segurança das Comunicações (Cepesc), que está ligado à ABIN.
A grande vantagem da votação informatizada, segundo Jairo Nicolau, pesquisador do Iuperj, e David Fleischer, do Departamento de Ciência Política da UnB, é a redução dos votos nulos ou em branco, essencialmente porque as cédulas eram demasiado complexas para a elevada percentagem de analfabetismo no Brasil. A combinação destes dois factores, a cédula complicada e o analfabetismo, conduzira sempre a um elevado número de votos nulos nas eleições anteriores à utilização da urna electrónica. Por outras palavras, David Fleischer aponta que, nas eleições para vereador em 1996 e 2000, a proporção de votos válidos subiu de 86,49% para 93,91%, enquanto os votos em branco e nulos diminuíram de 13,51% para 6,09%.
O procedimento informatizado das eleições brasileiras é tão interessante que tem captado a atenção de vários países. Para além de, no pleito do dia 3, terem estado presentes 150 observadores internacionais, oriundos de 36 países, não para fiscalizar o processo eleitoral, mas para aprender com ele, a urna electrónica já foi utilizada no Paraguai, na Argentina, no Equador e na Costa Rica, ainda que tenha sido proibida na Holanda (em Maio de 2008) e na Alemanha (em Março de 2009) por alegada falta de segurança.
Friday, October 8, 2010
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