Friday, October 1, 2010

As Eleições Brasileiras de Domingo

AS ELEIÇÕES BRASILEIRAS

É já no Domingo que mais de 134 milhões de eleitores Brasileiros vão às urnas escolher o sucessor de Lula, assim como os governadores dos estados, 2/3 dos deputados estaduais e federais e 2/3 dos senadores.
Interessante verificar, entretanto, a reviravolta que se tem processado ao nível das preferências da população relativamente ao novo presidente da República.
Até Julho/Agosto, as sondagens indicavam um empate técnico entre os dois principais candidatos: José Serra, do PSDB de Fernando Henrique Cardoso, e Dilma Rousseff, do PT de Lula. Em Abril, as sondagens davam 32% dos votos a Dilma e 40% a Serra, enquanto em Maio o empate fixava-se nos 37% para cada um. No início de Junho, Dilma chegou a ter 40% das preferências do eleitorado e Serra 35%, voltando o empate a surgir, no fim desse mês, nos 39%.
A partir de Julho, todavia, as variações caminhariam sempre no sentido do aumento de intenções de voto para Dilma e de diminuição para Serra, sendo de registar que, constante nos 8-9% entre Abril e o início de Setembro, Marina Silva, do Partido Verde (PV), subiu para 12%, de acordo com as sondagens do Ibope de meados de Setembro.
Na verdade, é Marina Silva quem mais se tem destacado no aumento das intenções de voto de Agosto até hoje, tendo passado dos 7% em finais de Agosto para 12% em meados de Setembro.
Significativo que, no último debate televisivo entre os candidatos, promovido Quinta Feira (30 de Setembro) pela Rede Globo, foi Marina Silva quem mais se destacou pela veemência do discurso inflamado (com que aliás já nos habituou). Embora o debate tenha sido morno, com Dilma e Serra a evitar o confronto bilateral e a jogar à defesa, optando, a primeira, por espicaçar Plínio Arruda, do PSOL (Partido Socialismo e Liberdade) e Marina, e o segundo por confrontar apenas Marina, a candidata do PV destacou-se também ao solicitar ao eleitorado que leve as eleições a segunda volta – o que cada vez se torna mais provável, embora há um mês não parecesse esse o caminho que tomariam as eleições de 3 de Outubro.
De facto, segundo as mais recentes sondagens, que têm vindo a realizar-se desde o início de Setembro, Dilma já passou de 51% (no início desse mês) para 50% (em meados do mês), situando-se hoje nos 49%, depois do debate de ontem. Isto tem resultado de uma clara migração de votos para Marina Silva, a candidata que mais cresce nas sondagens desde Agosto. Assim, bastam a Marina 3 ou 4 pontos percentuais para destronar a maioria absoluta de Dilma. E, se esta conseguir apenas 45-46% dos votos, como já foi cogitado, as eleições serão levadas a segundo turno a 31 de Outubro, entre Dilma e Serra.
As sondagens desta última semana têm sido mais sorridentes a Dilma, embora o espectro de uma segunda volta se mantenha, para o Instituto Datafolha, que, a 29 de Setembro, conferiu 52% a Dilma, 31% a Serra e 15% a Marina. O Ibope e o CNT/Sensus apresentam preferências de voto mais apelativas ainda para a candidata de Lula, segundo sondagens divulgadas a 28 de Setembro. Para o Ibope, Dilma segue à frente com 55%, seguida de Serra com 30% e de Marina com 14%. Para o CNT/Sensus, os dados revelados também no dia 28 são semelhantes: Dilma com 54,7%, Serra com 29,5% e Marina com 13,3%.
As sondagens têm apresentado oscilações nem sempre fáceis de interpretar. Fala-se mesmo de uma «guerra de sondagens», pois tão depressa Dilma surge como a grande vencedora logo na primeira volta, como se dá como certa uma ida a segundo turno, em função de algumas quedas que Dilma apresenta por vezes, que não têm afectado Serra, enquanto Marina continua a aumentar. Daí o espectro da segunda volta. Por outro lado, tomando em consideração as margens de erro das sondagens, que giram em torno dos 2 pontos percentuais, em alguns casos a vitória de Dilma a 3 de Outubro é posta em causa. Tomando como exemplo a sondagem do Datafolha acima mencionada, se a margem de erro de 2% se confirmasse, Dilma ficaria com apenas 50%, não alcançando os 50% mais um dos votos válidos para fazer eleger-se na primeira volta.
As margens estão, pois, muito reduzidas. A migração de votos para Marina e a diminuição dos votos nulos ou brancos nas sondagens, de 8% para 4%, segundo sondagem do Datafolha de 30 de Setembro, não animam o panorama para a candidata do PT.
Em caso de se ir a uma segunda volta, as últimas sondagens do Ibope, CNT/Sensus, Datafolha e Vox Populi dão a maioria absoluta a Dilma, com 55% dos votos, ficando-se José Serra pelos 38% (e os votos nulos ou brancos em 7%). Também nestas simulações de uma eventual segunda volta, Dilma vem crescendo significativamente desde Agosto. Até Julho, a diferença entre os dois candidatos era de 1-2%: em Maio registavam-se 46% para Dilma e 47% para Serra; em Junho 45% para Dilma e 45% para Serra e, em Julho, 46% para a primeira e 45% para o segundo. A partir de Agosto, a diferença foi-se alargando, chegando Dilma a ter, na sondagem referente aos dias 13 a 15 de Setembro, 57% e Serra apenas 35%. Ou seja, uma vantagem, para Dilma, de 22% sobre Serra. Na sondagem referente aos dias 21 e 22, essa vantagem baixou para 17%. Certo é que Fernando Henrique Cardoso já afirmou que, em caso de uma segunda volta, tudo fará para estabelecer uma ponte entre o seu candidato e Marina.
De alguma forma, estes resultados mostram que os escândalos envolvendo a Casa Civil do Presidente Lula, que levaram à resignação da Chefe da Casa Civil Erenice Guerra, não afectaram grandemente Dilma. A corrupção e o lobby da Casa Civil foram fortemente criticados pelos votantes das classes mais instruídas e de renda alta – uma fatia muito pequena do eleitorado brasileiro – mantendo-se todavia a preferência por Dilma nas restantes classes sociais.
Mas as eleições de 3 de Outubro e, se necessário, de 31 de Outubro, não são apenas para escolher o sucessor do carismático Lula. Os mais de 134 milhões de eleitores serão também chamados a escolher novos governadores para os estados, 2/3 dos deputados estaduais e federais e 2/3 dos senadores, de acordo com o sistema eleitoral brasileiro. Haverá, em consonância, a composição do governo que se espera, desde logo, vir a ser muito eclético, com uma base de suporte que irá do PT ao PCdoB (Partido Comunista do Brasil), passando pelo incontornável PMDB – o maior e mais constante vencedor das eleições estaduais e legislativas. Por uma razão muito simples: como não apresenta candidato à Presidência da República desde 1984, as negociações e as compensações em troca de apoios rendem-lhe sempre posições favoráveis e confortáveis, designadamente ao nível de grandes pastas do governo. Este facto é tanto mais verdadeiro quanto, em nome da nomeação de Dilma, Lula teve de conceder compensações. Afinal, enquanto Lula é fundador do PT, Dilma só se filiou no partido em 2001, o que constituiu um motivo forte para que muitas lideranças do PT criassem barreiras à indicação de Dilma. De alguma forma, Dilma terá sido «imposta» por Lula ao PT, sem possuir, nem capital político, nem o carisma de Lula. Além da margem de aprovação popular de Lula de 80%, segundo as últimas sondagens, Dilma nunca disputara antes qualquer pleito, enquanto Lula já se candidatara a presidente três vezes antes de ser eleito em 2002.
Estas condicionantes seguramente limitarão os alcances do PT nas eleições extra-presidenciais e, evidentemente, na composição do governo, onde se espera vir a ter uma participação menor. Ainda assim, cogitam-se, para a pasta da Fazenda, António Palocci, Guido Mantega ou Luciano Martinho. O que demonstra, claramente, a intenção, já muito anunciada por Dilma, de seguir o caminho da continuidade relativamente à Administração Lula. Em relação à Fazenda, de qualquer forma, quer ela, quer mesmo Serra, pouco poderiam inovar. Para além do próprio Serra ter tecido rasgados elogios a Lula durante a campanha eleitoral, não sendo de esperar que elaborasse grandes alterações, o Brasil tem regras relativas aos fluxos financeiros que tem de cumprir. E se já a política de Palocci e, depois, de Mantega, fora idêntica à de Pedro Malan do governo FHC, para os próximos quatro anos o cenário manter-se-á inalterado. Ademais, o sistema político brasileiro difere dos modelos anglo-saxónicos. Nestes, para que o candidato vença, tem de apregoar a mudança. No Brasil, a vitória é assegurada se apelar à continuidade. O que aliás explica a preferência do eleitorado por Dilma, ainda que, se esta está na sombra de Lula, o mesmo se pode dizer de Serra, para o qual atacar o ainda presidente seria dar um tiro no próprio pé. Já para a pasta das Relações Exteriores o nome mais falado é o do ex-Secretário Geral do Ministério das Relações Exteriores, Samuel Pinheiro Guimarães, que abandonou o cargo por ter completado 70 anos. Mas para ser ministro não existem limites etários.
Não esquecer, ainda, que o vice-presidente será do PMDB. O anterior vice-presidente, José de Alencar, empresário, era uma personalidade controversa, tendo mesmo defendido a bomba atómica (embora não tenha sido o único) e, ademais, oriundo de um partido pouco expressivo. Ao contrário, Michel Themer está bem posicionado. E deixará o PT em sérias dificuldades no caso de ter de assumir no lugar de Dilma que, embora tenha sido já dada como curada, persistem dúvidas quanto à sua capacidade física para liderar o Brasil herdado de Lula.
Para os quatro mais importantes estados do Brasil: São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro, esperam-se, respectivamente, as vitórias, para governador, de Geraldo Alckmin (PSDB), com 49%, frente a Aloísio Mercadante (PT), com apenas 27%; António Anastasia (PSDB), com 52% frente aos 43% de Hélio Costa (PMDB); Tarso Genro (PT), com 52% face a José Fogaça (PMDB), com 25%, e Yeda Crusius (PSDB), com apenas 15%; e de Sérgio Cabral (PMDB), com 67% contra os 21% de Fernando Gabeira (PV).
Vale lembrar que a lei eleitoral brasileira utiliza o pior sistema de representação proporcional de deputados eleitos: o sistema de lista aberta, de acordo com o qual os eleitores podem votar no partido ou num indivíduo de um partido. Em 95% dos casos em que os eleitores votam em nomes individuais, desconhecem a proveniência partidária dos candidatos. Até porque, muitas vezes, os próprios candidatos, na campanha eleitoral, omitem a sua referência partidária e apenas apresentam o nome, a fotografia e o número de código.
Este sistema de votação em nomes individuais tem levado ao aparecimento de candidatos, no mínimo, exóticos, mas que atraem camadas de eleitores, como por exemplo o humorista Tiririca, que se espera vir a obter cerca de 1 milhão de votos para o Senado. Recentemente, um artigo da BBC apelidou estes candidatos de «wacky». Além de Tiririca, são exemplos curiosos de candidatos a «Mulher Pêra» e a «Mulher Melão», sendo de ressaltar que também desportistas como Romário, Popó e Maguila se candidatam, assim como cantores como Netinho (candidato a senador por São Paulo, através do PCdoB) e Sérgio Reis.

No comments: