Sunday, October 31, 2010

CMPANHA PARA A 2ª VOLTA DAS PRESIDENCIAIS BRASILEIRAS DE HOJE

A CAMPANHA ELEITORAL PARA A 2ª VOLTA DAS PRESIDENCIAIS BRASILEIRAS DE 31 DE OUTUBRO DE 2010

A campanha eleitoral para a segunda volta das presidenciais brasileiras, depois de Dilma Rousseff, candidata do PT de Lula, ter vencido sem maioria absoluta sobre o seu principal adversário, José Serra, do PSDB de Fernando Henrique Cardoso, a 3 de Outubro, foi tensa e dominada por um tom acusatório por parte dos dois candidatos.
Se as sondagens realizadas mesmo durante o primeiro período eleitoral, no caso de uma eventual segunda volta, terem dado a vitória de Dilma por 55% dos votos, ficando-se Serra pelos 38%, contabilizando-se os votos nulos ou brancos em 7%, as sondagens realizadas durante o segundo período eleitoral continuaram a dar a vitória a Dilma.
Segundo a sondagem do Ibope de 28 de Outubro, Dilma vence com 57% dos votos válidos, ficando Serra com 43%. Contando com os votos totais, o Ibope aponta a vitória de Dilma por 52%, ficando Serra com 39%, enquanto os votos brancos ou nulos se ficam pelo 5% e os indecisos somavam ainda 4%. Dos 3010 entrevistados, 82% afirmaram que o voto era definitivo, enquanto que 13% disseram que ainda poderiam alterar o seu sentido de voto.
Interessante notar que a campanha eleitoral esteve dominada pela questão religiosa em torno do aborto, pelo que institutos de pesquisa como o Datafolha, o Vox Populi, o Ibope e o CNT/Sensus dividiram, por diversas vezes, os entrevistados por religiões, demonstrando que Dilma recebe as preferências dos católicos, tanto praticantes (cerca de 54% dos votos) como não praticantes (com 55%), enquanto Serra reúne vantagem entre os evangélicos, com 44%, contra os 42% de Dilma, talvez em função das acusações em torno do aborto que recaíram sobre o tucano durante a campanha.
Na verdade, durante o segundo turno, os dois candidatos evitaram o tema do aborto, enquanto os sectores religiosos mais conservadores usaram-no como moeda de troca para dar o seu apoio. Nesta campanha, tanto Dilma quanto Serra apresentaram-se como paladinos de uma cruzada moralista contra a despenalização do aborto, embora, no passado, ambos se tivessem expressado em favor da abertura ao direito de as mulheres decidirem. Segundo Lula, se Dilma não venceu logo na primeira volta em função do caso Erenice Guerra, o facto deveu-se, também, como incansavelmente afirmou ao longo destes trinta dias de grande tensão na campanha eleitoral, ao debate em torno do aborto. Este tema é polémico na sociedade brasileira. É um dado relevante no maior país católico do mundo, e no qual o número de fiéis evangélicos cresce rapidamente que, segundo estudos realizados, uma em cada cinco mulheres brasileiras com menos de 40 anos já fez um aborto, sendo que destas, 88% afirmam-se religiosas.
De registar, ainda, que, de um modo geral, as sondagens destes últimos trinta dias deram sempre a preferência por Serra nas regiões Sul, Sudeste, Norte e Centro-Oeste, sendo a vitória de Dilma dada como garantida, esmagadoramente, nos estados do Sudeste e do Nordeste, sendo certo que o tucano adquiriria votos nas classes sociais mais instruídas e Dilma nas classes média e média-baixa.
Não obstante, pairou sempre, na opinião pública generalizada, a ideia de um empate entre os dois candidatos, porque os institutos de pesquisa haviam dado a vitória a Dilma logo na primeira volta e isso não sucedeu. Por outro lado, não obstante o voto ser obrigatório no Brasil, espera-se uma forte abstenção (que tem sempre de ser justificada), porque dia 2 de Novembro é feriado nacional e muitas famílias farão ponte na Segunda-Feira, passando o fim-de-semana prolongado fora dos respectivos círculos eleitorais.
Face a este cenário, o último dia de campanha, Sexta-Feira, dia 29, foi de grande importância, tendo os dois presidenciáveis encerrado as respectivas campanhas em Belo Horizonte, Minas Gerais, o segundo maior colégio eleitoral do país. No último dia de horário eleitoral gratuito, no rádio e na televisão, ambos os candidatos apostaram num tom mais emotivo e, em alguma medida, festivo.
José Serra agradeceu aos eleitores, à família e à sua equipa de campanha, num tom comovente, com um novo vídeo clip do lema “Serra é do Bem”, o qual deu relevo à biografia e à trajectória do candidato a nível da vida política e, também, ao longo da campanha. Dilma apostou também num tom emotivo e na ideia da confiança na vitória. Explorou a despedida de Lula como presidente e apresentou cenas do aniversário de Lula – que, na Quinta-Feira, completou 65 anos de idade. Dilma apresentou ainda imagens do presidente pelo país e o programa eleitoral mostrou-a como uma “mulher pioneira”, enaltecendo as realizações do governo Lula-Dilma – vale lembrar que, já na campanha para a primeira volta, Lula atribuiu, a Dilma, os louros pelo sucesso de vários projectos de desenvolvimento económico que permitiram o avanço do Brasil, tanto interna, quanto externamente.
Importantíssimo, no último dia de campanha, foi o debate promovido pela Rede Globo entre os dois candidatos, com um formato totalmente diferente dos debates anteriores. Não houve perguntas entre os candidatos, tampouco a participação de jornalistas. O Ibope, a pedido da Globo, seleccionou 80 eleitores indecisos, que enviaram 5 perguntas cada um sobre os mais variados temas, da educação à saúde, ao meio ambiente, políticas sociais e outros. A Rede Globo escolheu, dentre essas, as 12 perguntas mais relevantes sobre cada tema e, no programa, os candidatos é que sortearam os eleitores, presentes no estúdio, e responderam às suas perguntas (com igual tempo para cada presidenciável, dois minutos, mesmo tempo destinado a réplicas e tréplicas e considerações finais). Os candidatos ficaram ainda com espaço para movimentar-se no estúdio. O PT, de início, reagiu a este formato, porque Dilma ainda se recupera da torção sofrida no pé direito, pelo que poderia ter dificuldades para caminhar, mas depois acabou por ceder.
Numa clara tentativa de evitar o clima de guerra que se havia instalado nos debates na segunda volta, os dois candidatos concentraram-se em responder aos temas propostos pelos eleitores indecisos, compondo, finalmente, um debate de propostas.
Acompanhado pela mulher e guru, a chilena Mónica, Serra levou também o baiano Jutahy Magalhães e o paulista Alberto Goldman, enquanto a comitiva de Dilma incluiu o gaúcho Marco Aurélio Garcia (assessor especial de Lula), a petista Marta Suplicy, o candidato a vice-presidente Michel Themer (PMDB) e Sérgio Cabral, o anfitrião (governador do Rio de Janeiro).
José Serra provocou subtilmente Dilma ao falar de corrupção e de inflação, referindo a sucessão de escândalos envolvendo políticos no país. Citando o “caso dos aloprados”, envolvidos na compra de dossiers contra a campanha de Geraldo Alckmin em 2006 (na sequência do qual ninguém foi condenado, não havendo sequer processo, apesar de a polícia ter apreendido 1,7 milhões de Reais), Serra fez referência indirecta aos escândalos na Casa Civil, mas ao contrário dos debates anteriores – nos quais o tucano sempre ressaltou as ligações entre a ex-ministra Erenice Guerra e Dilma – sem citar o PT, Dilma ou Erenice Guerra.
Salientando que a corrupção atingiu “níveis insuportáveis”, Serra propôs, como forma de combater as irregularidades, a necessidade de fortalecer as instituições fiscalizadoras, como o Tribunal de Contas da União e o Ministério Público. Serra concordou mesmo com Dilma quanto à necessidade de o Estado ampliar a sua participação na segurança pública, mas preferiu dizer que vai fortalecer a luta contra o contrabando de armas e drogas nas fronteiras e criar um Ministério da Segurança. Ainda relativamente a este tema, Serra defendeu a formação de um cadastro nacional de criminosos para que as forças de segurança dos estados possam monitorar a acção desses criminosos fora da sua área de abrangência. Dilma replicou, afirmando que esse cadastro já existe e que há iniciativas do governo para ampliar o banco de dados da Justiça e do sistema penitenciário.
Serra deu uma alfinetada em Dilma quando criticou a falta de infra-estruturas nas estradas rurais – que causa grande estrago à produção agrícola – e prometeu melhorar essa rede infra-estrutural.
Por outro lado, criticou também a política de saúde do governo, ainda que sem mencionar Lula, o que mereceu de Dilma o reconhecimento da existência de fragilidades no sector, o que a levou a prometer criar unidades de pronto atendimento que funcionem 24 horas por dia para desafogar os hospitais públicos.
Em matéria de políticas sociais, Serra defendeu a interligação entre o Bolsa Família e os programas federais como o Saúde Família, defendendo também a criação de mecanismos e estímulos para que as famílias não dependam da ajuda do governo, como o investimento no ensino profissionalizante.
Neste ponto, Dilma criticou o tucano ao referir que, em São Paulo, 300 mil famílias não recebem o Bolsa Família por falta de cadastramento (função que é do estado e dos municípios e não da União, sendo certo que Serra era governador de São Paulo até resignar para candidatar-se à Presidência). No fundo, disse ela, quem cuida dos pobres em São Paulo não é governo estadual, mas o governo federal.
Serra defendeu ainda a liberdade de imprensa, dizendo que ela é limitada no Brasil – embora a ONG Repórteres Sem Fronteiras tenha subido o Brasil da 71ª posição para a 58ª no seu relatório anual sobre o nível da liberdade de imprensa mundial, devido à evolução favorável da legislação no Brasil e dos passos positivos dados pelo país durante esta campanha eleitoral. Embora existam ainda casos de censura na imprensa, foi importante para este upgrade o facto de o Supremo Tribunal ter proibido as caricaturas dos candidatos, a inexistência de actos violentos contra jornalistas, a maior sensibilidade do governo relativamente ao acesso à informação e o facto de o Brasil ter uma das mais activas comunidades de internautas do mundo.
Por sua vez, Dilma, que no começo da campanha do segundo turno adoptara um discurso mais incisivo para barrar a eventual ascensão do adversário, também mudou de tom neste debate. Evitou mencionar o tucano, preferindo destacar as realizações do governo Lula, seu principal cabo eleitoral.
Questionada por um ex-agricultor gaúcho sobre projectos para a agricultura, a candidata do PT aproveitou para elogiar o Estado que a promoveu, afirmando que, durante o governo Lula, de cada dez tractores vendidos no Rio Grande do Sul, oito se destinaram à agricultura familiar.
Em matéria de segurança interna, Dilma prometeu melhorar as polícias Civil e Militar de todos os estados, expandindo a bolsa-formação (que hoje é concedida a 360 mil polícias) e através do reforço do policiamento comunitário nos bairros pobres.
Na réplica sobre a corrupção, Dilma destacou a actuação da Polícia Federal no combate aos casos de corrupção e apontou o papel da Controladoria Geral da União – órgão ligado à Presidência que foi responsável pela investigação no caso dos sanguessugas, quadrilha que desviava verbas do Ministério da Saúde.
Dilma defendeu, ainda, a desoneração da folha de pagamentos no país para aumentar a criação e formalização de empregos. Serra foi cauteloso e discordou, perguntando o que iriam retirar aos Brasileiros: o INSS? O Fundo de Garantia?
Como o formato do debate não permitiu que os candidatos fizessem perguntas um ao outro, este foi o debate mais produtivo desta campanha para a segunda volta, chegando a petista e o tucano a destacar, em consonância, a necessidade de valorizar os salários dos professores das escolas públicas e reforçar o Sistema Único de Saúde.
Os candidatos deixaram de lado expressões fortes como “farsa”, “entreguismo”, “quadrilha” e outras, bem como as acusações de corrupção e as denúncias, que entupiram esta campanha, e debruçaram-se sobre temas do quotidiano num tom ameno, para dar prioridade aos temas e não aos pecados de cada um. Não houve, neste sentido, questões polémicas sobre privatizações, pré-sal e legalização do aborto, assuntos que foram destaque nesta campanha tensa e acirrada. Até porque ambos os candidatos sabem bem que eleitores indecisos não gostam de posturas bruscas.
O resultado final deste debate frio foi o de um Serra ligeiramente no ataque (mas sem exaltação), fazendo críticas à rival e ao governo de forma indirecta, e uma Dilma na defensiva, preferindo destacar as realizações do presidente Lula. No fundo, um “zero a zero”, bom para quem joga pelo empate.
De notar que os resultados eleitorais só começarão a ser divulgados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a partir das 19h00 (hora de Brasília), apesar das eleições decorrerem entre as 8h00 e as 17h00. O problema que leva a atrasar em duas horas o período de apuramento é o horário de Verão e a diferença de fuso no Brasil.
Por isso, as pesquisas eleitorais de boca de urna só poderão ser divulgadas depois das 19h00, sendo que o TSE espera que a apuração de todos os votos esteja encerrada à meia noite.
Na primeira volta, as primeiras parciais começaram a sair às 18h00 e, perto das 20h30, cerca de 90% dos votos estavam já apurados. Agora, em termos relativos tendo em conta o horário de Verão e o fuso do Brasil, o apuramento será mais rápido por envolver apenas a disputa para presidente e governador dos Estados.

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